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Por que é que os jovens não conseguem comprar casa?

Os desafios da habitação para as novas gerações são cada vez mais. Dar resposta é urgente, defendem especialistas do setor.
08 mai 2023 min de leitura

Ter autonomia e mais independência: a aspiração de qualquer jovem que se prepara para fazer a transição para a vida adulta. Mas em Portugal, esse caminho está cada vez mais difícil. Desde os empregos e salários precários, às dificuldades no acesso à habitação. Comprar casa é, para muitos jovens, um sonho distante – e nem o arrendamento é viável em alguns casos. Os números do Eurostat não deixam margem para dúvidas: Portugal é o país da União Europeia (UE) em que os jovens saem mais tarde de casa dos pais - 33,6 anos, em média. E não é por apatia ou falta de vontade. A maioria não consegue mesmo pagar por uma casa.

Em 2021, a idade média em que os jovens deixaram a casa dos pais na UE era de 26,5 anos. Os valores variam entre os Estados-membros, mas a disparidade é evidente, segundo a autoridade estatística da UE. Portugal, Croácia, Eslováquia, Grécia ou Bulgária estão entre os países que registaram as idades médias mais elevadas de abandono do agregado familiar, com 30 anos ou mais. Em contraste, Estónia, Dinamarca, Finlândia e Suécia registaram as idades médias mais jovens, 23 anos ou menos. E a Suécia é mesmo o país onde os jovens adquirem a sua independência mais cedo, deixando a casa de família, em média, aos 19 anos.

Os sentimentos de insegurança perante o futuro e incapacidade de planeamento da vida fazem parte, por isso, do dia a dia dos jovens portugueses. Mas será que “Este país não é para jovens?”. Este foi o mote da conferência organizada pela ERA no Salão Imobiliário de Portugal (SIL), e que reuniu vários especialistas do setor para debater os desafios da habitação para as novas gerações. Por que é que em Portugal é tão difícil sair de casa dos pais? E por que é que os jovens não conseguem comprar casa?


 

Compra da primeira casa cada vez mais tardia

A compra da primeira casa é cada vez mais tardia e a realidade tende a agravar-se. A raiz do problema é, segundo os especialistas, multifatorial, mas está a atingir grandes proporções. A falta de oferta, aliada ao fosso entre os preços das casas e salários é um entrave, assim como a dificuldade de acesso ao crédito habitação, que hoje se rege por critérios mais apertados e que, por isso, deixa de fora muitos jovens à procura de concretizar o sonho de ter casa.

Além de um direito constitucionalmente consagrado, Romana Xerez, professora no ISCSP-ULisboa e investigadora no CAPP, autora do estudo “Acesso à habitação própria em Portugal”, lembra que a “casa é uma narrativa positiva que dá segurança às pessoas”, daí que desempenhe um papel tão importante nas suas vidas. A académica salienta que “o acesso dos jovens a habitação agravou-se de uma forma acentuada”, uma situação “complexa” que representa um “risco social muito grande”. E não só pelo facto de não se conseguir comprar casa, mas aquilo que ela representa: capacidade de constituir família, bem-estar, alcance de autonomia.

“Chegámos aqui devido a vários fatores: o preço da habitação que subiu de forma impressionante; a crise de 2008; a crise da pandemia; a guerra na Ucrânia e aumento do custo de vida, que não sabemos onde vai parar. Esta geração tem de enfrentar multicrises”, frisa a investigadora.

A dificuldade de acesso ao crédito habitação

A maioria dos jovens precisa de recorrer a financiamento bancário para comprar casa. E o sonho começa por “esbarrar” aqui, desde logo porque a banca apenas empresta uma parte do valor do imóvel – no máximo 90% –, sendo necessário ter capitais próprios para comportar os restantes encargos: não só o valor da entrada (pelo menos 10%), mas também impostos e outros custos inerentes.

O problema? A maioria dos jovens não tem liquidez ou poupanças suficientes para pagar a entrada de uma casa, que hoje em dia pode representar montantes avultados, face à subida dos preços dos imóveis. E depois, a estes obstáculos, juntam-se outros: há estabilidade financeira para a assumir a prestação de uma casa? Os rendimentos são suficientes? No caso de um aumento das taxas de juro (como se verifica atualmente), como fica a taxa de esforço?

António Ribeiro, representante do Santander, relembra que atualmente os critérios estão apertados para a generalidade das pessoas. Comprou a primeira casa aos 26 anos, mas admite que se fosse hoje, muito provavelmente, e perante as novas regras, ele próprio não conseguiria cumprir os critérios para pedir dinheiro ao banco e comprar casa.

 

“As dificuldades em aceder ao crédito habitação resultam de um conjunto de normativos que a banca tem de respeitar e que limita muito a própria imaginação do setor financeiro para encontrar soluções”, uma vez que é um “modelo intelectualmente cinzento”, diz. Apesar disso, o responsável acredita que o setor pode fazer parte da solução, mas para isso será necessário um esforço de equipa entre o setor bancário, o poder político e autárquico. “Eu acredito muito nos jovens. Acredito que vamos encontrar soluções e acredito que o setor financeiro pode ajudar a encontrar soluções”, salienta.

Também para Alexandre Poço, líder nacional da JSD, que faz parte do Grupo de Trabalho da Habitação do PSD, a “não ser que tenha pais ricos, um jovem não consegue ter dinheiro suficiente para dar entrada numa casa, tendo em conta o valor percentagem, os impostos, etc..” e, por isso, considera que devia pensar-se num instrumento estatal capaz de funcionar como garantia para a compra da primeira casa, e destaca a proposta avançada pelo seu partido que pretende ajudar os jovens na aquisição de habitação.

Recorde-se que o PSD apresentou um conjunto de medidas para responder à crise na habitação. E entre elas há duas medidas focadas em facilitar a compra de casa por parte dos jovens portugueses: a isenção de IMT e de imposto do selo na compra de habitação própria; e a atribuição de uma garantia pública do valor de entrada que os jovens têm de pagar ao banco no momento de pedir um crédito habitação para adquirir casa, sendo assim assegurado um financiamento a 100%. Esta garantia, tal como explica Alexandre Poço, seria atribuída aos jovens até aos 35 anos que pretendam adquirir uma habitação até 250 mil euros.


 

Como fazer de Portugal um país para jovens?

Filipa Roseta, vereadora Câmara Municipal de Lisboa, com o Pelouro da Habitação e Desenvolvimento local, recorda que "quem trata o problema da habitação quer resolvê-lo” e a única coisa que pede, enquanto representante do poder local, é que “não lhes mandem para cima mais problemas”. “Queremos é soluções”, diz a responsável, numa referência ao programa Mais Habitação do Governo que, segundo Filipa Roseta, vem colocar mais obstáculos aos municípios.

Lamenta que o título da conferência seja “Este país não é para jovens?”. “É necessário, pelo debate importante de ideias, mas triste”, diz, sublinhando que “não pode haver a ideia de que há gerações que tem menos que outras”. “Não pode acontecer uma geração que teve tudo e outra que não tem nada. Tem de haver um contrato intergeracional (...) Este é um país para a toda a gente”, defende.

Romana Xerez também lamenta que “tenhamos perdido oportunidades”. Para a investigadora, o programa Mais Habitação “tem poucochinho para a juventude”. “Este programa não contempla os jovens. Tem o Porta 65 que foi criado nos anos 90 perante uma situação completamente diferente da que vivemos. É muito pouco, precisamos de muito mais”, defende.

problema do acesso à habitação também está na falta de oferta e, por isso, é fundamental aumentar o número de casas disponíveis, segundo o líder da JSD. Relembra que uma grande força motriz para a construção de mais casas é, precisamente, o setor privado. “Temos de um aumento de oferta nos segmentos médios”, frisa Alexandre Poço.

O CEO da ERA Portugal, Rui Torgal, não tem dúvidas que o Portugal deverá ser um país para jovens, até “porque um país que não tenha jovens é um país que não existe”, na opinião do mediador. Para o responsável, “não faz absolutamente sentido nenhum nós estarmos a criar talento que é constantemente exportado”. “Tornámo-nos um país de reformados, um país em que aquilo que temos como estratégia é criar benefícios fiscais para pessoas que queiram vir para cá “acabar” a sua vida ou pessoas que queiram começar a sua vida. E, portanto, eu diria que há muito para fazer. Tem que ser feito muito. Mas eu acredito de uma forma absolutamente convicta que este país tem que ser um país de jovens. Não temos outra alternativa”, refere em declarações ao idealista/news, à margem do debate.

Fonte: Idealista

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